Pesquisa revela avanços do cinema negro no Brasil
Matéria publicada em 27/dez/2015 no jornal A Tarde.
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AGÊNCIA BRASIL
O projeto de cinema Tela Preta, coletivo de realizadoras negras ligado à Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), é um dos destaques das pesquisas sobre o cinema negro no Brasil. O tema ganhou maior projeção em 2015 com o filme Kbela, de Yasmin Thainá, que surpreendeu com quatro sessões lotadas no prestigiado Cinema Odeon – incluindo a primeira lotação para 600 pessoas após reforma da casa, no centro do Rio de Janeiro.
O filme é considerado um dos mais importantes representantes de uma leva de produções feitas por realizadoras negras que ganharam o mundo este ano. São narrativas que contam com mulheres negras na direção, na produção e como protagonistas, em um terreno onde elas costumam ser estereotipadas.
Levantamento da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ, feito em 2014, já apontava para a sub-representação da mulher negra no cinema nacional. Para a professora do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) e doutora em história Janaína Oliveira, Kbela rompeu essa lógica em 2015.
Curta-metragem Kbela estreia em Salvador nesta sexta, 8/jan.
Referência
Coordenadora do Fórum Itinerante de Cinema Negro (Ficine), um espaço de formação e reflexão sobre a produção de realizadores negros, Janaína afirma que Kbela não está sozinho. Segundo a pesquisadora, que em 2015 circulou por festivais em países como Burkina Fasso, Cabo Verde e Cuba discutindo e divulgando essas produções, os filmes das realizadoras negras brasileiras alcançaram qualidade internacional e já são uma referência, embora pouco conhecidos no próprio país.
Para a pesquisadora, o cinema negro é um campo político, de luta por representação e desconstrução de estereótipos, de tornar as representações mais complexas, de ampliação de representações nos espaços mais diversos.
“O cinema negro tem toda uma história, que começa nos Estados Unidos, passa pela diáspora negra, caminha por vários lugares”, explica a pesquisadora. “Hoje, além do samba, carnaval e futebol, temos o estereótipo da violência na favela presente. (O filme) Cidade de Deus, ambientado em uma favela e com protagonistas negros, claramente não é cinema negro”, frisa Janaína.
A pesquisadora ressalta as dificuldades para fazer imagens contra-hegemônicas, que desconstroem o estereótipo dentro de um grande estúdio de cinema ou de uma grande rede de televisão. Ela passou a ter interesse pela temática, a partir do cinema africano. “O primeiro filme africano que vi foi no Festival de Cinema do Rio (de Janeiro), o Vida sobre a Terra, de Abderrahmane Sissako, diretor, escritor e cineasta da Mauritânia, autor de Timbuktu, longa-metragem que concorreu ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2014 e a prêmio no Festival de Cannes no mesmo ano”, lembra.
Projeto baiano
Segundo ela, o chamado cinema negro brasileiro ainda está limitado às produções de curta-metragem, com produções feitas com ajuda de editais ou universidade. “São pouquíssimos os negros que fizeram filmes de longa-metragem de ficção na nova geração, aliás, fica a provocação”. Ainda assim, no universo dos curta-metragens, as mulheres destacam-se nas produções que atingiram patamar de técnica e de qualidade.
Janaína cita os exemplos das produções de Renata Martins, que fez Aquém das Nuvens; Juliana Vicente, que fez o Cores e Botas e o Minas do Rap;Viviane Ferreira, que fez o Dia de Jerusa; além de Eliciana Nascimento e o projeto Tela Preta, coletivo de realizadoras negras ligado à UFRB, na Bahia.
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